Uma ocasião extraordinária para falar de coração
aberto sobre a Igreja, o sacerdócio, as tentações e os desafios dos
consagrados. Foi o que ocorreu na manhã desta segunda-feira, na Sala Paulo VI,
no Vaticano, com o encontro do Papa com alunos dos Colégios pontifícios e
Institutos de Roma. O Santo Padre deteve-se longamente com seminaristas e
sacerdotes, sem nenhum texto preparado. A saudação ao Pontífice foi feita pelo
Cardeal Beniamino Stella.
Falar de coração para coração, livremente, como fazem um pai e um filho que se querem bem. Foi a dimensão vivida no encontro entre o Papa e os alunos dos Colégios pontifícios e Institutos de Roma.
Francisco dialogou com seminaristas e sacerdotes provenientes do mundo inteiro e dirigiu, em primeiro lugar, um pensamento especial de proximidade aos cristãos da Ucrânia e do Oriente Médio ressaltando que a Igreja sofre muito também hoje, em muitas partes do mundo, por causa das perseguições.
Em seguida, respondendo à primeira pergunta sobre a formação sacerdotal, o Papa chamou a atenção para o "perigo do academicismo" que acaba fazendo com que se volte de Roma para as dioceses mais como "doutores" do que como "presbíteros":
"E se alguém cai neste perigo do academicismo, volta para a diocese não o padre 'tal' ou 'qual', mas o 'doutor', não? E isso é perigoso. Existem quatro pilares na formação sacerdotal: e isso o disse várias vezes, talvez vocês tenham ouvido. Quatro pilares: a formação espiritual, a formação acadêmica, a formação comunitária e a formação apostólica."
Vem-se a Roma, observou, para a formação intelectual, mas não se pode entender um padre que não tenha uma vida comunitária, uma vida espiritual e apostólica. "O pluralismo acadêmico – advertiu – não faz bem." O Senhor, acrescentou Francisco, "chamou-os a serem sacerdotes, a serem presbíteros: essa é a regra fundamental:
"Se somente se vê a parte acadêmica há o perigo de cair nas ideologias, e isso faz adoecer. Adoece também a concepção de Igreja. Para compreender a Igreja é preciso entendê-la a partir do estudo, mas também da oração, da vida comunitária e da vida apostólica. Quando caímos numa ideologia, porque somos macrocéfalos, por exemplo, e seguimos por esse caminho, temos uma hermenêutica não cristã, uma hermenêutica da Igreja ideológica. E isso faz mal, essa é uma doença."
A hermenêutica da Igreja, reiterou, "deve ser a hermenêutica que a própria Igreja nos oferece, que a própria Igreja nos dá". É preciso entender "a Igreja com olhos de cristão". Do contrário, observou, "não se entende a Igreja, ou acaba sendo mal entendida".
Em seguida foi feita ao Papa uma pergunta sobre como o Seminário pode tornar-se uma comunidade de crescimento humano e espiritual. Uma vez, observou o Santo Padre, um bispo ancião da América Latina disse que "é muito melhor o pior seminário do que a ausência do seminário".
O Santo Padre ressaltou que "a vida do seminário, ou seja, a vida comunitária, é muito importante. É muito importante porque há partilha entre os irmãos". É verdade, constatou, que "existem problemas, existem lutas: lutas de poder, lutas de idéias, inclusive lutas veladas; e vêm os vícios capitais: a inveja, os ciúmes." "A vida comunitária – disse com ironia – não é o paraíso: ao menos, o purgatório." E recordou que um santo jesuíta "dizia que a maior penitência, para ele, era a vida comunitária":
"Mas creio que por isso temos que seguir adiante, na vida comunitária. Mas como? São quatro-cinco coisas que nos ajudam muito: jamais falar mal dos outros! Se tenho alguma coisa contra o outro ou que não concordo: devo dizer face a face! Mas nós, clérigos, temos a tentação de não falar cara a cara, de sermos por demais diplomáticos, aquela linguagem clerical, assim... Mas nos faz mal, nos mal!"
O Papa Bergoglio recordou que 22 anos atrás, assim que foi nomeado bispo, teve uma conversação muito forte com um secretário seu, um jovem sacerdote que recentemente havia sido ordenado. "Muito respeitoso, mas me disse poucas e boas". E depois, acrescentou o Papa, pensei: "Jamais me desfarei dele como secretário: este é um verdadeiro irmão!"
"Ao invés, aqueles que nos dizem coisas bonitas na frente e depois não tão bonitas por trás... Aquilo é importante, mas os mexericos são a peste de uma comunidade: é preciso falar face a face, sempre. E se você não tem a coragem de falar face a face, fale ao superior ou ao diretor... que ele o ajudará. Mas não se deve ir de quarto em quarto dos companheiros para falar mal dos outros! É costume dizer que os mexericos são coisa de mulher: mas são também nosso, de nós homens! Nós fofocamos muito! E isso destrói a comunidade."
Outra coisa, prosseguiu o Papa, "é ouvir, escutar as diferentes opiniões e discutir sobre elas", "buscando a verdade, buscando a unidade: isso ajuda a comunidade". Francisco recordou que seu diretor espiritual o exortara a rezar por uma pessoa de quem estava enraivecido. Rezar, "nada mais".
E ressaltou a importância da "oração comunitária". Asseguro a vocês, disse, "que se fizerem essas duas coisas, a comunidade seguirá adiante, se pode viver bem, se pode falar bem, se pode discutir bem juntos": "não falar mal dos outros e rezar por aqueles com os quais tenho problemas".
Em seguida, foi a vez de uma pergunta sobre o "discernimento, vigilância e disciplina pessoal" de um consagrado. O Papa disse que a vigilância é uma atitude cristã. É importante perguntar-se "o que que há no meu coração", porque "onde está o meu coração está o meu tesouro". O primeiro conselho, frisou, "quando o coração está atribulado", é o conselho dos monges russos: "Colocar-se sob o manto da Santa Mãe de Deus", confiar a própria pessoa a Nossa Senhora:
"Alguém de vocês poderá me dizer: 'Mas Padre, em nosso tempo de boa modernidade, da psiquiatria, da psicologia, nestes momentos de turbulência creio que seria melhor recorrer ao psiquiatra que me ajude...'. Não descarto isso, mas em primeiro lugar recorrer à Mãe: porque um padre que se esquece da Mãe e sobretudo nos momentos de turbulência, falta-lhe alguma coisa." (RL) (Fonte;
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