sábado, 18 de outubro de 2014

Papa Francisco: quem passa fome são pessoas e não números

Por ocasião da Jornada Mundial da Alimentação, celebrada ontem, o papa Francisco observou que "apesar dos avanços em muitos países, os últimos dados continuam apresentando uma situação inquietante, agravada pela diminuição geral das ajudas públicas ao desenvolvimento". O papa se manifestou em carta enviada ao brasileiro José Graziano da Silva, diretor geral da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura).

Esta Jornada, afirma o papa, "ecoa o grito de tantos irmãos e irmãs nossos que, em diversas partes do mundo, não têm o pão de cada dia". A data também "nos faz pensar na enorme quantidade de alimentos desperdiçados, nos produtos que são destruídos, na especulação com os preços em nome do deus lucro".

Segundo o papa, este é "um dos paradoxos mais dramáticas do nosso tempo, ao qual assistimos com impotência e, frequentemente, também com indiferença". Mas Francisco olha para além dos dados, indicando que "há um aspecto importante do problema que ainda não recebeu a devida consideração nas políticas e nos planejamentos de ação: quem sofre a insegurança alimentar e a desnutrição são pessoas e não números, e, precisamente por causa da sua dignidade como pessoas, elas estão acima de qualquer cálculo ou projeto econômico".

Por outro lado, o Santo Padre observa que o tema proposto pela FAO para esta Jornada (Agricultura familiar: alimentar o mundo, cuidar do planeta) enfatiza a necessidade de se partir das pessoas, como indivíduos ou como grupos, na hora de se proporem novas formas e modos de gestão dos vários aspectos da alimentação.

Em particular, o pontífice indica que "é necessário reconhecer cada vez mais o papel da família rural e desenvolver todas as suas potencialidades".  Ele faz um convite, assim, a se prestar mais atenção às necessidades da família rural, "não só [as necessidades] técnicas, mas também humanas, espirituais, sociais". E complementa: "Temos que aprender da experiência delas, da sua capacidade de trabalho e, acima de tudo, desse vínculo de amor, de solidariedade e de generosidade que existe entre os seus membros e que é chamado a ser modelo para a vida social".

A carta do papa também afirma que a família "favorece o diálogo entre as diversas gerações e planta as bases para uma verdadeira integração social, além de representar essa desejada sinergia entre trabalho agrícola e sustentabilidade". É bom falar da família rural e celebrar anos internacionais para recordá-la, mas não é suficiente: "essas reflexões têm que abrir passagem para iniciativas concretas".

Em um segundo ponto, Francisco afirma que "defender as comunidades rurais diante das graves ameaças da ação humana e dos desastres naturais não deveria ser só uma estratégia, mas uma ação permanente que favoreça a sua participação na tomada de decisões, que coloque ao seu alcance tecnologias apropriadas e estenda o seu uso, respeitando sempre o meio ambiente". Nunca como agora o mundo precisou tanto que as pessoas e as nações se unam para superar as divisões e os conflitos existentes.

Por esta razão, Francisco exorta à partilha e à solidariedade, uma obrigação que não pode se limitar à distribuição de alimentos. "Compartilhar quer dizer tornar-se próximo de todos os homens, reconhecer a comum dignidade, estar atentos às suas necessidades e ajudá-los a remediá-las, com o mesmo espírito de amor que se vive numa família", afirma o papa.

No terceiro ponto da sua reflexão, o Santo Padre reconhece que, para vencer a fome, é necessário "mudar o paradigma das políticas de ajuda e de desenvolvimento, modificar as regras internacionais em matéria de produção e comercialização dos produtos agrícolas, garantindo a autodeterminação do mercado agrícola nos países em que a agricultura representa a base da economia e da sobrevivência".

Chegou a hora, diz Francisco, de pensar e decidir com base em cada pessoa e comunidade, e não a partir da situação dos mercados.

Ao terminar, o bispo de Roma explica que a Igreja católica "está disposta a oferecer, iluminar e acompanhar tanto a elaboração de políticas como a sua colocação em prática, consciente de que a fé se torna visível ao se realizar o projeto de Deus para a família humana e para o mundo, mediante uma profunda e real fraternidade que não é exclusiva dos cristãos, mas que inclui todos os povos". (Fonte; Zenit)


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