domingo, 17 de abril de 2011

Amor cristão é ativo, diz Cantalamessa na 4ª Pregação da Quaresma

Papa Bento XVI e a Cúria Romana participaram nesta sexta-feira, 15, da quarta e última meditação ministrada pelo pregador da Casa Pontifícia, frei Raniero Cantalamessa, OFM Cap, no itinerário de preparação quaresmal. O tema deste dia abordou a relevância social do Evangelho.

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.: NA ÍNTEGRA: Um amor feito de atos - 4ª Pregação da Quaresma

Na última meditação, o frei capuchinho havia falado sobre a abordagem paulina da necessidade de o amor cristão ser sincero. Já nesta quarta pregação, é a doutrina de João a base para defender a argumentação de que esse amor também deve ser ativo. Na comunidade primitiva de Jerusalém, tal exigência traduz-se em partilha. "Mas isso não era um ideal de pobreza, mas de caridade; o objetivo não era de serem pobres, mas que não houvesse 'nenhum necessitado' (At 4, 34)", explicou Raniero.

O amor cristão deve ser ativo, ou seja, traduzir-se em gestos concretos de caridade que, entre outros, constituirão a matéria do Juízo Final, disse o frei capuchinho.

"Os historiadores da Igreja veem neste espírito de solidariedade fraterna um dos fatores principais da missão e propagação do cristianismo nos primeiros três séculos. Tudo isso traduziu-se em iniciativas – e mais tarde em instituições – dedicadas especialmente à cura dos enfermos, apoio às viúvas e aos órfãos, auxílio aos encarcerados, alimentar os pobres, assistir os forasteiros", ressaltou.


O problema social

Já a época moderna, sobretudo no século XVIII, assinalou uma mudança que trouxe à tona o problema social. Compreendeu-se que não bastava prover caso a caso a necessidade dos pobres e dos oprimidos, mas é preciso agir sobre as estruturas que criam os pobres e os oprimidos. Aí nasceu a Doutrina Social da Igreja (DSI).

Através da Encíclica Rerum novarum, de Leão XIII, de 15 de maio de 189, a Igreja entrou definitivamente como protagonista neste processo. O pregador explica que naquela época, três eram as orientações dominantes sobre o significado social do Evangelho: antes de tudo, a interpretação socialista e marxista. As conclusões principais dessa abordagem são que o Evangelho foi principalmente um grande anúncio social dirigido aos pobres; todo o resto seria revestimento religioso, secundário, uma "super-estrutura". Jesus foi um grande reformador social que desejou redimir as classes inferiores da miséria.

A historiografia da União Soviética rejeitará essa interpretação que, no seu parecer, concedia um papel muito grande ao cristianismo. Nos anos 60, a abordagem salienta a figura de Jesus como revolucionário político de um movimento de libertação. Por sua vez, o filósofo Nietzsche chegou a uma conclusão análoga àquela do movimento marxista, mas com um viés de interpretação totalmente negativo: o cristianismo teria nascido como um 'ressentimento' dos fracos contra as naturezas mais fortes; seria a 'inversão de todos os valores', uma freada no lançar o humano à grandeza.


A reflexão teológica: teologia liberal e dialética

Na Igreja, tal abordagem também segue algumas orientações gerais, entre as quais, a da teologia liberal e da teologia dialética.

A teologia liberal defende que entre fator religioso e econômico há uma relação de dependência recíproca, não de submissão. No entanto, a posição da mensagem evangélica se opõe, como se nota, tanto à redução do Evangelho à proclamação social e à luta de classes quanto à posição do liberalismo econômico do livro jogo de forças.

A teologia dialética repreende, por sua vez, a visão liberal, sobretudo no seu ponto de partida, sua ideal do reino dos céus. "Para os liberais isso é de natureza essencialmente ética, é um sublime ideal moral que tem como fundamento a paternidade de Deus e o valor infinito de cada alma. Para os teólogos dialéticos (K. Barth, R. Bultmann, M. Dibelius), isso é de uma natureza escatológica, é uma intervenção soberana e gratuita de Deus, que não se propõe a mudar o mundo, quanto denunciar sua estrutura atual (“crítica radical”), anunciar o fim eminente (“escatologia conseguente”), lançando o apelo à conversão (“imperativo radical”)", esclarece Cantalamessa.

O pregador destaca que as mutações no ritmo de vida e de trabalho trazidas pela Revolução Industrial não levam a soluções “cristãs” para os desafios do cotidiano, assim cada cristão é chamado a responder a isso sobre a própria responsabilidade, na obediência, ao apelo que Deus faz, chegar na situação concreta na qual ele vive, também se encontra um critério fundamental no amor concreto ao próximo.

"O Evangelho não fornece soluções diretas aos problemas sociais, mas contém alguns princípios que se prestam a elaborar respostas concretas às diversas situações históricas. Posto que as situações e os problemas sociais mudam de época em época, o cristão é chamado a encarnar de tempos em tempos os princípios do Evangelho na situação presente. A colaboração das Encíclicas sociais dos Papas é precisamente esta: seguem-se umas às outras, retomando cada uma o discurso do ponto em que parou a precedente, atualizando-o com base nas instâncias novas que surgem na sociedade e também na interrogação sempre nova da Palavra de Deus", concluiu Cantalamessa.


Verdade, caridade e serviço

A Encíclica de Bento XVI, lembra o pregador, “Caritas in veritate” mostra quais são os fundamentos bíblicos que dão base ao caráter social do Evangelho: a caridade e a verdade, lembra o pregador.

"A verdade preserva e exprime a força da libertação pela caridade nos eventos ao longo da história e sem a verdade, sem a confiança e amor pela verdade, não existe consciência e responsabilidade social, não é possível agir socialmente em vez de agir por interesses privados e pela lógica do poder”, escreveu Bento XVI.

Assim, no ponto de vista prático, os cristãos são chamados a operar diretamente pelo social. Cantalamessa recorda que Jesus fez do serviço um dos pontos do seu ensinamento e Ele próprio veio para servir e não para ser servido (cf. Mc 10,45).

Tendo isso em vista, o pregador do Papa destaca que a partir desse ponto Nietzsche negaria um dos maiores bens trazidos pelo cristianismo à humanidade: o valor do serviço.

“O serviço é um dos princípios universais, se aplica a cada aspecto da vida: o Estado deveria estar a serviço dos cidadãos, o político a serviço do Estado, o médico a serviço do doente, o professor a serviço dos alunos...”, enfatiza.

Mas a Igreja recorda que o serviço, por si só, não é uma virtude, mas surge de diversas virtudes, sobretudo da humildade e da caridade. É uma maneira de manifestar aquele amor que “não busca os próprios interesses, mas aqueles dos outros” (Fil 2,4), que se doa sem esperar nada em troca.


Programa

As meditações quaresmais aconteceram sempre às sextas-feiras, às 9h (em Roma – 5h no horário de Brasília), na Capela Redemptoris Mater, sob a direção do pregador da Casa Pontifícia, frei Raniero Cantalamessa, OFM Cap.

O tema das meditações quaresmais deste ano foi "Sobretudo, revesti-vos do amor" (Cl 3, 14). As Pregações da Quaresma começaram no dia 25 de março e seguiram até este dia 15.

Fonte: Canção Nova

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